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Especial: Organizações sociais protestam contra acusados de tortura durante a ditadura

Bruno Bocchini .

São Paulo - Movimentos sociais, coordenados pelo Levante Popular da Juventude, fizeram na manhã de segunda-feira (26) manifestações para expor publicamente ex-militares e policiais acusados de tortura, abusos sexuais e homicídios durante a ditadura militar (1964-1985). Os atos ocorreram em frente à casa ou no local de trabalho dos acusados. As ações estão programadas para ocorrer em seis estados: São Paulo, Rio Grande do Sul, Minas Gerais, Santa Catarina, Pará e Ceará.

Em São Paulo, a sede da empresa de segurança privada Dacala, do delegado aposentado do antigo Departamento de Ordem Política e Social (Dops), David dos Santos Araujo, foi o alvo da manifestação. Cerca de 200 pessoas – com cartazes que traziam estampados os rostos de presos políticos mortos durante a ditadura – denunciaram a participação do ex-delegado em assassinatos e tortura durante o regime.

O ex-delegado Santos Araujo é acusado pelo Ministério Público Federal (MPF) de participar da tortura e do assassinato, em abril de 1971, do ativista político Joaquim Alencar de Seixas. De acordo com o MPF, o ex-delegado foi reconhecido por parentes da vítima.

Em 30 de agosto de 2010, o MPF moveu ação pública para que Araujo fosse pessoalmente responsabilizado pelas práticas criminosas. Segundo o relato do atual presidente do Conselho Estadual de Defesa da Pessoa Humana de São Paulo, Ivan Seixas, preso aos 16 anos, junto com o pai, Joaquim Alencar de Seixas, David dos Santos Araujo, o “capitão Lisboa”, estava entre os torturadores.

“[Ele] era o que mais batia”, disse no depoimento ao MPF. Seixas também contou que, como forma de pressão, os policiais o torturaram e o levaram para uma área deserta e simularam seu fuzilamento. Uma das irmãs de Seixas afirmou ao MPF que foi abusada sexualmente por Araujo.

“O ato é para pressionar, para que a Comissão da Verdade ocorra de fato. A gente veio para dialogar com quem trabalha com o acusado de tortura. [É para] expor, constranger e denunciar o torturador para quem convive com ele”, disse um dos porta-vozes do movimento, o estudante da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP) Caio Santiago.

Segundo os organizadores, a manifestação foi inspirada em ações similares feitas na Argentina e no Chile, chamadas de Escracho. “Saímos à rua hoje para resgatar a história do nosso povo e a história do nosso país. Lembramos talvez da parte mais sombria da história do Brasil e que parece ser propositadamente esquecida: a ditadura militar”, diz o texto do manifesto lido em frente à empresa de Araujo, na zona sul de São Paulo.

A reportagem entrou em contato com a empresa Dacala para tentar ouvir o ex-delegado, mas ainda não obteve retorno.

O Levante Popular da Juventude surgiu em 2006 no Rio Grande do Sul, com jovens de universidades, das periferias das cidades e do campo. Hoje conta com aproximadamente 200 militantes no país. Também particiaparam do ato em São Paulo membros do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), da Consulta Popular e do Comitê Paulista pela Memória, Verdade e Justiça.

Fonte: / NOTIMP

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Protestos contra suspeitos de tortura

Em sete capitais, grupo se mobilizou em frente aos locais de trabalho e às residências de ex-agentes do Estado. Especialista apoia ação, mas critica os atos de vandalismo

Guilherme Amado

Centenas de integrantes do movimento Levante Popular da Juventude fizeram segunda-feira protestos em sete capitais em frente às casas e às empresas onde moram e trabalham ex-agentes suspeitos de terem atuado como torturadores na ditadura militar. A manifestação, realizada na semana em que o golpe de 1964 completa 48 anos, defende a instalação da Comissão Nacional da Verdade e ocorreu simultaneamente em São Paulo, Porto Alegre, Belo Horizonte, Fortaleza, Rio de Janeiro, Belém e Curitiba.

A ação, batizada pelos jovens de "esculhacho", contou com a pichação da calçada em frente ao prédio de um possível torturador, a distribuição de cópias de documentos do Departamento de Ordem Política e Social (Dops) e a fixação de faixas em espaços públicos. "Quisemos tensionar esse debate pela Comissão da Verdade e conscientizar a população. Por isso, por exemplo, mostramos fotos de torturados", explicou Rafael Coelho, militante do movimento. Sancionada em novembro, a comissão depende da nomeação dos sete titulares para começar a funcionar.

Em São Paulo, o protesto foi em frente à empresa de um suposto torturador que, de acordo com os manifestantes, seria conhecido na ditadura pela alcunha de Capitão Lisboa. No Rio, nos Arcos da Lapa, havia uma faixa com os dizeres: "Levante-se contra a tortura: em defesa da Comissão da Verdade". Outro grupo fazia panfletagem em frente ao Clube Militar. Em Belo Horizonte, a manifestação ocorreu no Bairro da Graça, contra um ex-investigador do Departamento de Vigilância Social acusado de ter torturado diversos militantes de esquerda. As cópias de documentos do Dops mostravam relatos das sessões de tortura. Em Porto Alegre, a manifestação foi em frente à casa de um ex-chefe do Serviço Nacional de Informações (SNI).

O ex-secretário de Direitos Humanos Nilmário Miranda considerou legítima a manifestação. "Acho importante que ocorra esse debate sobre a tortura, os torturadores, a anistia e a impunidade, pois fala-se muito que no Brasil não existe clamor público para discutir a impunidade da tortura e os desaparecimentos", defendeu Miranda, ponderando que não concorda com atos de vandalismo, como a pichação. "O que os outros moradores têm a ver com isso?", critica o especialista.

Miranda encarou o protesto como uma reação contra o manifesto publicado pelos clubes militares em fevereiro passado. Na ocasião, a caserna criticou uma postura possivelmente revanchista de integrantes do governo e do PT devido à criação da Comissão da Verdade.

Ideli cita Guerrilha do Araguaia

A ministra de Relações Institucionais, Ideli Salvatti, disse ontem no Senado, em solenidade em homenagem aos 90 anos do PCdoB, que o governo tem o compromisso de localizar os corpos dos militantes de esquerda desaparecidos na Guerrilha do Araguaia no início dos anos 1970. "Temos muito compromisso com a militância do PCdoB, o mais forte, de permitir que se localizem os corpos da Guerrilha do Araguaia, para que as famílias desses combatentes possam dar um enterro digno e fazer todas as honras a esses que lutaram em condições adversas", afirmou.

Fonte: / NOTIMP

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José Luiz Niemeyer dos S. Filho: Comissão da Verdade tem de incluir elites civis

A comissão deve investigar as elites empresariais conservadoras que se uniram a militares em 64 para manter privilégios, inclusive o seu papel nos casos de tortura

A discussão das últimas semanas, referente às ácidas cartas de setores da reserva das Forças Armadas sobre o processo de criação de uma Comissão da Verdade, coloca um ponto importante para nossa reflexão.

Quem pensou, organizou e operacionalizou o movimento de 1964?

A resposta soa clara ao aluno desatento do ensino médio: militares.

Mas não. A participação ativa dos setores civis da sociedade no golpe militar de 31 de março de 1964 deve ser discutida e aprofundada, inclusive naquilo que se refere à tortura e ao desaparecimento daqueles que se opunham ao regime.

Não se muda a história. A participação civil nos regimes ditatoriais é regra quando se observa alguns dos processos históricos contemporâneos. Além dos militares e dos serviços secretos, sempre há aqueles grupos civis que incentivaram a ruptura institucional a partir do uso da força militar.

Foi assim no movimento de ascensão do nazismo na Alemanha, do fascismo na Itália e do comunismo na antiga União Soviética. É padrão: o setor conservador e radical das Forças Armadas se ancora no meio civil como braço auxiliar para a ação de poder.

E tão grave quanto: os setores civis, principalmente das elites empresariais conservadoras, utilizam-se da caserna para manterem privilégios e garantirem novas regalias.

O grande historiador Tony Judt, no épico "Pós-Guerra" (no Brasil, disponível pela editora Objetiva), mostra essa aproximação difusa e obscura entre civis e militares nos projetos de tomada do poder à força na história contemporânea.

Quando a ministra de Direitos Humanos Maria do Rosário menciona a importância de elucidar a participação dos setores e grupos civis nos processos de radicalização do regime de 1964, ela está certa.

Se os excessos cometidos pelos radicais de farda ocorreram, é necessário ressaltar que eles aconteceram também por incentivo e por interesse desses grupos.

Vale lembrar que a deflagração do golpe militar de 1964 foi precedida por uma movimentação da classe média paulista (a chamada "Marcha com Deus Pela Liberdade", que foi organizada também por grupos ligados às grandes empresas de São Paulo).

O ano de 1964 é também resultado do apoio irrestrito dos chamados "capitães da indústria" de São Paulo e dos representantes mais conservadores das oligarquias agrárias do Nordeste à época.

São grupos civis, com origem ligada ao empresariado, que frequentavam recepções de congraçamento entre civis e militares, gabinetes governamentais e ambientes acadêmicos ideológicos, como a Escola Superior de Guerra -chamada pelos próprios "estagiários" mais envaidecidos de "Sorbonne brasileira", que viam no golpe de 1964 uma oportunidade única.

Essa oportunidade se baseava em uma estratégia que foi regra mestra no desenvolvimento econômico do período: o arrocho salarial para manutenção dos ganhos de capital, agenda decisiva para a manutenção do patamar de lucratividade dos investimentos nacionais e internacionais no período após Juscelino, de rápida industrialização do país.

Mas o incentivo para o golpe e o decisivo apoio durante boa parte da execução do regime de 1964 não ficam restritos a essa ação quase "institucional" dos grupos civis que se fundiam aos interesses dos militares mais radicais à época.

Mais graves foram as ações pensadas e organizadas diretamente por grupos civis radicais, como o obscuro "Comando de Caça aos Comunistas", a "Operação Bandeirantes", entre outras, que foram conduzidas a partir de ações clandestinas, com o apoio dos serviços secretos militares e das lideranças e grupos empresariais à época.

Esperemos que, se criada, a Comissão da Verdade, de alguma forma, também possa se deter nesta seara que envolve uma segunda sombra do regime de 1964.

JOSÉ LUIZ NIEMEYER DOS SANTOS FILHO, 45, doutor em ciência política pela USP, coordena o departamento de relações internacionais do Ibmec-RJ (Instituto Brasileiro de Mercado de Capitais)

Jovens protestam contra acusados de tortura

Movimento organizado pela internet promoveu atos em sete capitais em frente a casas de ex-agentes da ditadura

Grupo afirma não ter ligação com partidos políticos; ex-delegado ameaça mover processo contra manifestantes

Um movimento organizado por jovens na internet promoveu segunda-feira manifestações em sete capitais contra ex-agentes da ditadura militar (1964-1985) acusados de torturar presos políticos.

Os atos ocorreram em frente às casas ou aos locais de trabalho de civis e militares em São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Porto Alegre, Curitiba, Belém e Fortaleza.

Os organizadores afirmaram não ter filiação partidária e se apresentaram como integrantes do Levante Popular da Juventude, grupo ligado ao movimento pela reforma agrária Via Campesina.

Eles estenderam faixas e picharam calçadas com inscrições como "Aqui mora um torturador" e gritaram palavras de ordem pela instalação da Comissão da Verdade.

As ações foram organizadas em segredo e se inspiraram nos "escrachos", protestos semelhantes realizados no Chile e na Argentina.

Em São Paulo, o ato reuniu cerca de 150 pessoas em frente à empresa de segurança privada Dacala, em Santo Amaro (zona sul), que pertence ao delegado aposentado David dos Santos Araujo.

Em 2010, ele foi acusado de tortura pelo Ministério Público Federal, numa ação que pedia a cassação de sua aposentadoria e cobrava o ressarcimento por indenizações pagas a suas supostas vítimas.

Segundo a Procuradoria, Araujo era chamado de "capitão Lisboa" e participou da tortura e do assassinato do militante Joaquim Alencar de Seixas no Doi-Codi, em 1971.

A juíza Diana Brunstein, da 7ª Vara Cível Federal, julgou a ação improcedente e afirmou na decisão que ele foi beneficiado pela Lei da Anistia.

O advogado Paulo Esteves disse que o policial nega as acusações e estuda processar os ativistas por suposta tentativa de invasão de imóvel.

Em Porto Alegre, ativistas picharam a calçada em frente ao prédio do coronel Carlos Alberto Ponzi, ex-chefe regional do SNI (Serviço Nacional de Informações), órgão de espionagem da ditadura.

Em Fortaleza, cerca de 80 pessoas protestaram em frente ao escritório do ex-delegado federal José Armando Costa, acusado de torturas no livro "Brasil: Nunca Mais", da Arquidiocese de São Paulo.

Também citado no dossiê, o ex-policial Ariovaldo da Hora Silva foi o alvo em Belo Horizonte, onde cerca de 70 manifestantes colaram cartazes no muro de seu edifício.

Ponzi, Costa e Silva não foram localizados ontem.

Os organizadores comemoraram o resultado. "Vamos realizar outros atos até a gente conseguir a instalação da Comissão da Verdade", disse a estudante da USP Lira Alli.

Fonte: / NOTIMP


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