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A ordem é voar








Pressão das empresas aéreas prevalece sobre preocupações de segurança e a União Europeia decide avançar na normalização dos voos, depois de cinco dias de paralisação quase total provocada pela erupção de um vulcão na Islândia. Nova coluna de fumaça pode retardar a reabertura dos céus

Isabel Fleck

De um lado, representantes das companhias aéreas que amargam um prejuízo de US$ 250 milhões por dia, desde a última quinta-feira, com o fechamento de grande parte do espaço aéreo europeu. De outro, governos, controladores de voo e especialistas em segurança, que alertam para os riscos de voar sobre o continente enquanto não se dissipar a nuvem de cinzas gerada por um vulcão na Islândia. Venceu o argumento econômico: a Espanha, que ocupa a presidência rotativa da União Europeia, anunciou a normalização progressiva do tráfego aéreo a partir de hoje. Calcula-se que nos últimos cinco dias tenham sido cancelados mais de 60 mil voos. Ontem, apenas 30% dos previstos foram mantidos.

O Eurocontrol, órgão para a segurança da navegação aérea, acredita que o movimento se normalize até quinta-feira, “se tudo continuar como está atualmente e o vulcão parar de emitir cinzas para a Europa”, estimou o diretor do organismo, Bo Redeborn. Ontem, pela primeira vez, o Eyjafjallajokull liberou lava — o que, segundo especialistas, é sinal de que entrou em uma fase mais “calma”. A coluna de fumaça(1), que alcançou até 9 mil metros na última quinta-feira, não ultrapassou os 3 mil metros ontem. No fim da noite, contudo, uma nova coluna de cinzas começou a deslocar-se em direção ao Reino Unido. “A última informação mostra que a situação está piorando em algumas áreas”, afirmou o serviço de controle do tráfego aéreo britânico.

Milhares de passageiros(2) “ilhados” em alguns países da Europa, ou mesmo os que querem voltar para os países afetados, aguardam uma mudança no céu. Mas a expectativa é ainda maior para as companhias aéreas. O diretor da Associação Internacional de Transporte Aéreo (Iata), Giovanni Bisignani, afirmou que a crise causada pelo vulcão já supera a gerada pelos ataques de 11 de setembro de 2001. Alguns analistas estimam que as perdas do setor somem US$ 1 bilhão. Duas das maiores empresas do setor na Europa, a Air France e a British Airways, perderam, juntas, US$ 77 milhões por dia. A norte-americana United Airlines viu suas ações recuarem mais de 5%.

Exagero

Para Bisignani, a decisão de fechar praticamente todo o espaço aéreo europeu foi exagerada. “Os europeus utilizam um sistema baseado em um modelo teórico, em vez de adotar decisões baseadas nos fatos e em uma análise dos riscos”, disse o diretor da Iata, que agrupa 230 companhias. O presidente do Sindicato Nacional Francês dos Controladores Aéreos, Stéphane Durand, no entanto, não viu “excesso”. “As medidas de segurança não são necessariamente adequadas às aspirações econômicas ou sociais. Essa medida foi adotada em escala europeia, por governos que têm um enfoque às vezes diferente na área de segurança”, disse Durand.

O especialista em aviação Bill Voss, presidente da Flight Safety Foundation, de Washington, concorda. “Nós já sabemos desde os anos 1980 que a cinza vulcânica é um perigo único e mortal para aviões modernos. O fechamento do espaço aéreo europeu provavelmente salvou muitas vidas na semana passada”, destacou, em entrevista ao Correio. Ontem, um oficial americano relatou, em Bruxelas, que foram encontrados restos de vidro — gerado pela cristalização das cinzas vulcânicas — na turbina de um avião F-16 da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan, aliança militar entre os EUA e a Europa) que voou na região.

1 - Benefício ambiental

O caos aéreo provocado pela nuvem de cinzas expelida pelo vulcão na Islândia terá ao menos um benefício para o mundo: a redução de 206 mil toneladas de CO2 emitidas na atmosfera por dia. A conta é do especialista David McCandless, autor do livro Information is beautiful, que reuniu informações da União Europeia, do United States Geografic Service e do Nordic Volcanological Institute para contabilizar o impacto ambiental da erupção do Eyjafjallajokull. A expectativa é que, com o “apagão aéreo”, deixem de ser emitidas, no total, 2,8 milhões de toneladas de dióxido de carbono. As emissões do próprio vulcão chegam a 15 mil toneladas de CO2 por dia.

2 - Transporte alternativo

Com os aeroportos fechados, os outros meios que ligam os países da Europa, como as empresas de trem e a Eurostar — que faz a travessia do Canal da Mancha — aumentaram o número de viagens e de passagens disponíveis. No fim de semana, a Eurostar disponibilizou seis trens extras para atender a um fluxo 30% maior que o normal. O governo do Reino Unido também vai ajudar cerca 200 mil britânicos que tentam voltar para casa, utilizando navios na Marinha enviados ontem à Espanha. A ideia é usar o país como “escala” para britânicos que retornam de avião da África e da Ásia. O resto do trajeto seria feito de navio. Quem ficou “preso” na Flórida (Estados Unidos) por causa do caos aéreo na Europa, no entanto, poderá deixar o estresse de lado nos parques aquáticos da rede Seaworld. A empresa anunciou que dará ingressos para três de seus parques a quem foi afetado pelo vulcão.

Viajantes frustrados no Rio e São Paulo

Ullisses Campbell

São Paulo — O caos aéreo na Europa deixou mais de 1.500 pessoas sem voar de São Paulo para diversas cidades, só ontem. No Aeroporto de Guarulhos, os guichês das companhias internacionais passaram o dia tentando convencer passageiros a remarcarem passagens de voos cancelados. Até as 18h, 20 partidas tinham sido suspensas, mas como se trata de fenômeno natural, não de falha mecânica, os passageiros pareciam conformados. “Prefiro adiar a viagem e voar com mais segurança. Mesmo que demore um pouco mais e exija mais gastos”, disse o médico Benjamin Blanco, que tinha viagem marcada para Frankfurt, na Alemanha. A companhia ficou de entrar em contato hoje para informar quando ele poderá embarcar com a família.

No Aeroporto Internacional do Rio de Janeiro, a Infraero registrou ontem nove atrasos e três cancelamentos dos cerca de 50 voos internacionais programados com destino à Europa. Os painéis indicavam mais de 20 atrasos e 13 cancelamentos, mas a empresa garantiu que os painéis não refletiam a situação, já que as companhias aéras fazem apenas duas atualizações por dia.

O arquiteto Elias Antoniolli estava com passagem marcada para viajar ontem de São Paulo para Paris, num voo direto, com a intenção de participar de um congresso que começará hoje. A Air France, que emitiu o bilhete, ofereceu um a ele em um voo que seguiria para Toulouse, com a chance de seguir para a capital francesa se as condições permitissem. Maicon não aceitou, porque perderia dois dos três dias do congresso. “Não faz sentido nenhum. Desisti do evento e vou tentar ser reembolsado.”

Em Guarulhos, os funcionários da maioria das companhias aéreas gritavam para avisar aos passageiros, nas filas de check in, que não adiantava tentar viajar para Alemanha, Áustria, Bélgica, Dinamarca, Estônia, Finlândia, Hungria, Irlanda, Letônia, Luxemburgo, Holanda, República Tcheca, Romênia, Eslováquia, Suíça e Reino Unido.

O advogado Leandro Wetterich, 34 anos, deveria sair do Brasil para participar de um congresso de médicos em Atenas (EUA). De lá, seguiria a passeio para Barcelona e Lisboa. Antes de partir, foi informado de que não teria como voar para Europa nesta semana. Para evitar transtornos, Wetterich resolveu cancelar a viagem toda. “Achei melhor ficar, já que a solução do problema não depende das companhias”, avaliou.

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Fonte: CORREIO BRAZILIENSE, via NOTIMP




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