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Lei de Acesso gera pedidos de acesso a papéis da ditadura; Lei de Acesso dá transparência e reduz espaço de lobistas

RUBENS VALENTE e LÚCIO VAZ .

A área militar no Executivo federal, em Brasília, recebeu 119 pedidos de informação nos três primeiros dias de vigência da Lei de Acesso à Informação, que entrou em vigor na última quarta-feira.

A nova lei permite que todo cidadão requisite quaisquer informações a Executivo, Judiciário, Legislativo e Ministério Público.

Os órgãos têm a obrigação de atender os pedidos, sob pena de punição ao servidor que se recusar a fornecê-las.

No Ministério da Defesa e nas Forças Armadas, houve procura por documentos produzidos pela ditadura militar (1964-1985), como eventuais relatórios sobre a morte do jornalista Vladimir Herzog (1937-1975) e o atentado a bomba no Riocentro, em 1981.

Os militares também receberam pedidos sobre o Plano Nacional de Defesa, que prevê investimentos bilionários.

O Ministério da Justiça e sete órgãos a ele vinculados, como a Polícia Federal e o Arquivo Nacional, receberam 144 pedidos nos três dias.

As dúvidas mais frequentes dizem respeito a processos por indenizações previstas na Lei da Anistia, dúvidas sobre viagens e outros gastos e atas de reuniões.

Embora tenham sido duas das áreas mais acionadas na Esplanada dos Ministérios, com 12% do total de pedidos, a área militar e o Ministério da Justiça não apareceram no ranking divulgado pela CGU (Controladoria Geral da União) na sexta-feira.

A divergência ocorreu porque, no caso do Ministério da Justiça, a CGU não contabilizou os pedidos feitos aos órgãos subordinados à pasta.

Na lista da CGU, o mais requisitado foi o Banco Central, com 160 pedidos de um total de 2.217. O BC explicou à Folha, porém, que um erro no sistema o levou à primeira posição: um mesmo pedido foi contabilizado 58 vezes.

Sem a repetição, o BC cai para o terceiro lugar e o Ministério da Justiça sobre para o primeiro. A área militar é a terceira mais procurada, abaixo do Ministério do Planejamento.

SENADO

Em três dias de vigência da Lei de Acesso, o Senado recebeu 42 pedidos de informação. O mais polêmico é a lista dos salários dos servidores da Casa. A diretora-geral, Dóris Peixoto, informou que os dados não seriam revelados porque estariam protegidos pela Constituição.

Na sexta-feira, o presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), afirmou que vai esperar que o Executivo detalhe como vai ser feita a divulgação da sua folha.

A maioria dos pedidos feitos ao Senado está relacionada a despesas e mordomias, como o fornecimento de combustível para carros oficiais, gastos com apartamentos funcionais e aposentadorias de ex-senadores.

O STF (Supremo Tribunal Federal) recebeu pouco mais de dez pedidos, na maioria informações sobre despesas dos 11 ministros da corte.

Fonte: / NOTIMP

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"Lei de Acesso dá transparência e reduz espaço de lobistas"

Entrevista Vânia Vieira, diretora de Prevenção à Corrupção da Controladoria-Geral da União

Denize Bacoccina

Nos últimos seis meses, ministérios, autarquias e empresas públicas de todos os níveis de governo se prepararam para abrir seus arquivos. A Lei 12.527, a Lei de Acesso à Informação, que entrou em vigor na quarta-feira 16, determina que qualquer cidadão tem o direito de examinar documentos produzidos ou custodiados pelo Estado, desde que não tenham sido expressamente classificados como sigilosos. Da mesma maneira, as empresas terão acesso a documentos, notas técnicas e atas de reuniões e poderão saber como, por exemplo, o governo decidiu desonerar impostos de um setor e não de outro. Também poderão saber o que as agências reguladoras estão fazendo, inclusive em relação aos concorrentes. "A lei reduz a assimetria de informação entre os agentes econômicos", diz a diretora de Prevenção à Corrupção da Controladoria-Geral da União (CGU), Vânia Vieira, responsável por preparar o governo federal para cumprir a lei. Ou seja, grandes e pequenas empresas passam a atuar com maior igualdade, já que ambas podem ter acesso às mesmas informações, reduzindo o espaço para atuação de lobistas.

DINHEIRO – Que tipo de dado será público com a Lei de Acesso à Informação?
VÂNIA VIEIRA – Qualquer informação produzida ou custodiada pelo Estado, que não esteja classificada como sigilosa e não seja pessoal.

DINHEIRO – E como é feito o processo de classificação do que é ou não é sigiloso?
VÂNIA – A lei não revogou os sigilos que estão previstos em outras leis, como o fiscal, o bancário, o profissional e o segredo de Justiça. A nova lei garante o acesso a informações públicas. A lei também diz que a informação só é efetivamente pública quando ela é finalizada. Durante o processo em curso, ela é protegida. Por exemplo, as reuniões e documentos são sigilosos durante o processo de discussão de um assunto.

DINHEIRO – Na prática, vamos ter acesso a muito mais dados e informações do que temos atualmente?
VÂNIA – Essa lei será uma revolução na administração pública. É uma nova lógica. É extremamente reduzida a lista de hipóteses para justificar a classificação de um documento como secreto: defesa, planos estratégicos das Forças Armadas, relações diplomáticas, estabilidade econômico-financeira. É um rol muito enxuto. Além disso, qualquer cidadão pode solicitar a informação sem ter de apresentar nenhuma justificativa para o pedido.

DINHEIRO – Na área econômica, vamos ter acesso a muitos documentos ou a lei permite classificar todo o processo decisório como secreto?
VÂNIA – Estou muito otimista no sentido de que, de fato, vamos conseguir inverter essa lógica. Fizemos um trabalho intenso de sensibilização dos ministérios, para cumprir a lei. E a lei diz expressamente que, uma vez finalizado o processo de tomada de decisão, é preciso abrir todo o processo.

DINHEIRO – Qual a importância da lei para o efetivo combate à corrupção?
VÂNIA – Para o combate e, especialmente, a prevenção à corrupção, ela é indispensável. Sem transparência, você não consegue garantir essa vigilância da sociedade nem a própria inibição do gestor corrupto. A transparência é o melhor antídoto. Mas a lei é muito mais do que isso, ela tem uma grande importância para a economia. Reduz muito a assimetria entre os agentes econômicos. Ou seja: independentemente do porte, todas as empresas terão acesso, em igualdade de condições, às informações de governo. Nos Estados Unidos, as empresas são as maiores usuárias da lei de acesso à informação. No México, as companhias são o segundo grupo, depois dos cidadãos.

DINHEIRO – E que tipo de pesquisa tem sido solicitado nesses países?
VÂNIA – Informações sobre políticas econômicas, agências reguladoras, etc. Por exemplo: o que a agência reguladora está fazendo em relação às suas concorrentes, se está punindo. Gera uma competição benéfica. Quando você garante que todos os agentes econômicos tenham a mesma informação, reduz a atuação dos lobistas. O que eles fazem é justamente vender informação. Já recebi a visita do pessoal da Confederação Nacional da Indústria (CNI) dizendo que pretende usar bastante a lei para saber os fundamentos de determinada política econômica.

DINHEIRO – Muitos gestores públicos devem estar preocupados, porque eles serão mais vigiados...
VÂNIA – Muitos ainda nem sabem que a lei existe, principalmente nos municípios. A lei vale para todos os órgãos públicos, de todas as instâncias. Mas acho que com o tempo as pessoas vão perceber que a lei, além da transparência, contribui para a melhoria da própria gestão pública. Ela exige que a administração invista muito na gestão da informação. Se o órgão não tiver hoje um processo de registro e arquivamento da informação, não será capaz de atender à lei. E nós, infelizmente, não temos tradição de fazer agenda, ata de reunião ou estudos para embasar as decisões tomadas pelo poder público.

DINHEIRO – A documentação será algo obrigatório nas reuniões do governo a partir de agora?
VÂNIA – Não existe nenhum tipo de sanção por não ter a informação. Mas o órgão terá de admitir isso e a pressão da sociedade pode levar a mudanças. Todos terão de se adaptar. No México, a maioria dos pedidos recebe como resposta que a informação não está disponível. Temos de superar a cultura do sigilo e também superar a cultura de falta de registro das informações. A lei força essa mudança. É um processo.

DINHEIRO – Essas informações serão públicas?
VÂNIA – Mesmo que os dados sejam sigilosos durante o processo de discussão, depois que determinada decisão for anunciada, tudo fica público. A lei é expressa: se o ato final é público, tudo o que o pressupôs, que o fundamentou, também é público. O sigilo é sempre exceção. O acesso à informação é a regra.

DINHEIRO – Quem serão os maiores usuários da lei no Brasil?
VÂNIA – Acho que num primeiro momento a imprensa e também as entidades da sociedade civil e entidades empresariais. Acreditamos que, no início, teremos um público mais qualificado, que normalmente busca e não consegue acesso a essas informações. Existe uma demanda reprimida. Mas, com o tempo, haverá um público mais abrangente, conforme as pessoas ficarem sabendo que podem exigir o acesso. Eu, particularmente, estou convencida de que a Lei de Acesso à Informação se equipara, em importância, ao Código de Defesa do Consumidor. Será realmente um divisor de águas.

DINHEIRO – E os ministérios estão preparados para isso?
VÂNIA – Nos últimos meses, trabalhamos incessantemente para que a lei fosse cumprida. Tivemos um prazo curto, de apenas seis meses, enquanto outros países, como a Inglaterra, tiveram cinco anos para implementar uma lei semelhante. São 38 ministérios, 160 autarquias e fundações e mais um conjunto de empresas públicas. Mas houve um empenho muito grande e uma determinação da presidenta Dilma Rousseff para que todos se adequassem. Todos os ministérios e outros órgãos do governo têm um serviço de informação ao cidadão, com um posto de atendimento pessoal e um acesso pelo site. Eles vão receber as solicitações, que devem ser respondidas em, no máximo, 30 dias. Nós nos espelhamos muito no México para montar os nossos serviços, e lá 95% dos pedidos são feitos pela internet. Muitos desses dados já estavam disponíveis, mas faltava uma padronização, especialmente de nomenclatura, para facilitar o acesso e a compreensão da informação.

DINHEIRO – Houve treinamento de funcionários para atender a essa nova demanda?
VÂNIA – A CGU deu treinamento presencial para cerca de 600 servidores, que vão trabalhar diretamente com os SICs. Fizemos também um treinamento a distância para explicar o que é a lei. Já treinamos cerca de 800 pessoas, e queremos chegar a 13 mil até o fim do ano.

DINHEIRO – As despesas da Presidência da República, como gastos com cartão de crédito, estarão disponíveis ao público a partir de agora?
VÂNIA – Depende. Hoje os cartões de crédito já são públicos, estão todos no Portal da Transparência. Só não estão os cartões utilizados pela Abin, pela Polícia Federal e pela segurança da presidenta. A grande inovação é que será publicada uma lista anual de todos os documentos classificados como sigilosos, com o grau de classificação – se é reservado, secreto ou ultrassecreto – e a autoridade que classificou, com o devido código indexador. Ou seja, vamos saber tudo o que é secreto e quem pediu o segredo.

DINHEIRO – Como ficou o acesso às informações do Banco Central? Os votos dos conselheiros do Comitê de Política Monetária (Copom) serão abertos?
VÂNIA – A lei não trata de nenhuma especificidade. Mas uma das hipóteses para classificar uma informação como sigilosa é defender a estabilidade econômico-financeira do País. A direção do Banco Central pode classificar assim alguns de seus documentos. Mas as pessoas podem discordar e entrar com uma ação na Justiça. É assim que funciona em todos os países e aqui não será diferente.

Fonte: / NOTIMP


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