Irã: Brasil e Turquia superestimaram Obama
 
 Especialista iraniano prepara livro a  respeito da relação entre os EUA e o Irã durante o governo do democrata .
Especialista iraniano prepara livro a  respeito da relação entre os EUA e o Irã durante o governo do democrata .
Trita Parsi avalia que aliados confiaram em excesso no americano, que  tinha pouco poder sobre o seu Congresso .
CLAUDIA ANTUNES . 
O  maior erro do Brasil e da Turquia ao negociarem com o Irã o acordo de  troca de combustível nuclear foi subestimar a fraqueza política do  presidente americano, Barack Obama, em relação ao Congresso, que na  época pressionava por mais sanções contra Teerã.
Além disso, afirma o iraniano radicado nos EUA Trita Parsi, quando o  acordo foi assinado, em 17 de maio de 2010, os EUA já tinham fechado o  entendimento com a Rússia por uma nova rodada de punições no Conselho de  Segurança da ONU.
"Brasileiros e turcos usaram a carta de Obama de 18 de abril como a  palavra final do governo, mas ela não era necessariamente a palavra mais  autorizada sobre o tema", disse Parsi à Folha.
Presidente do Conselho Nacional Iraniano-Americano, que defende a  reaproximação diplomática entre EUA e Irã, Parsi prepara a publicação de  um livro analisando por que negociações entre o democrata e a República  Islâmica não foram adiante.
Para o capítulo sobre a Declaração de Teerã assinada por Irã,  Brasil e Turquia, o pesquisador do Middle East Institute (Washington)  entrevistou autoridades dos países envolvidos, incluindo o ministro da  Defesa, Celso Amorim, na época chanceler.
Em entrevista neste ano à Folha, Amorim disse que falou com a  secretária de Estado americana Hillary Clinton, por iniciativa dela,  três ou quatro dias antes da viagem a Teerã com o então presidente Luiz  Inácio Lula da Silva.
Já havia, contou Amorim, uma "diferença de tom" entre a carta de Obama e a atitude de Hillary. "Ela reiterou cuidados, disse que seríamos enganados, mas nunca disse para não fazer o acordo."
No telefonema, a secretária de Estado pediu que o Brasil ajudasse na  soltura de três alpinistas americanos presos em 2009 no Irã (uma, Sarah  Shourd, teve a libertação mediada pelo Brasil).
Para Parsi, a Casa Branca foi surpreendida pelo acordo, que "desarrumou"  seus planos. "A decisão de partir para as sanções já tinha sido tomada,  independentemente da diplomacia."
O iraniano acredita que é quase nula a possibilidade de avanço em  negociações sobre o programa nuclear do Irã antes da eleição americana  de 2012, apesar de a Rússia ter acabado de fazer uma nova proposta de  diálogo.
EUA têm dever de ajudar no progresso de outros países
EX-SECRETÁRIA DE ESTADO AMERICANA NEGA PERCEPÇÃO DE DECLÍNIO DO PAÍS E PEDE A DIVISÃO DE RESPONSABILIDADES
PATRÍCIA CAMPOS MELLO
Dez anos após os atentados de 11 de Setembro, em meio à crescente percepção de que os americanos estão se tornando cada vez mais fracos no cenário internacional, Madeleine Albright, a primeira mulher a ser secretária de Estado dos EUA, vai contra a corrente.
Os EUA não estão em declínio e mantêm sua função de intervir em países  ao redor do mundo para garantir que não se tornem Estados falidos,  acredita Albright, que liderou a política externa americana no  governo Clinton, de 1997 a 2000. "Mas nós não vamos fazer isso sozinhos  -também brasileiros vão se beneficiar muito se não formos mais cercados  por Estados falidos", disse Albright em entrevista exclusiva à Folha.
"Nossos países, que sabem como liderar democracias funcionais, precisam trabalhar juntos para ajudar outros países."
A ex-secretária, que hoje é sócia da consultoria Albright Stonebridge  Group e dá aulas na Universidade Georgetown, virá ao Brasil em outubro.  Ela é uma das melhores amigas da atual secretária de Estado, Hillary  Clinton.
Abaixo, trechos da entrevista, feita por telefone, de Washington.
Folha - De que maneira duradoura os atentados de 11 de Setembro mudaram a forma como os EUA veem o mundo?
Madeleine Albright - O 11 de Setembro foi um dos acontecimentos mais  significativos para o povo americano. Eu nasci na Europa, na escalada  para a Segunda Guerra Mundial (Albright nasceu na então Tchecoslováquia,  em 1937, mas é cidadã americana). Eu sei o que é se sentir vulnerável.
A maioria dos americanos nunca havia se sentido vulnerável, foi um  choque enorme. O efeito desse choque é muito duradouro, e é importante  que os americanos não fiquem dominados pelo "fator medo". Existe uma  discussão entre analistas sobre a suposta decadência dos EUA no cenário  global e o fato de esse declínio ser inevitável.
Eu não concordo com essa discussão. Eu vejo o mundo de forma muito  diferente. Vejo muitos países ganhando poder no mundo, mas isso é bom. E  isso ocorre porque as grandes questões de hoje -proliferação nuclear,  terrorismo, pobreza, energia, ambiente, crise financeira- exigem a  participação de vários países para resolvê-las, não podem ser abordadas  apenas por uma potência.
Isso não é um sinal do declínio dos EUA. Nós achamos que isso é  bom, celebramos a ascensão do Brasil, o fato de existir outro país com o  qual podemos compartilhar responsabilidades.
Na discussão para elevar o teto do  endividamento, haverá redução do deficit que atinge em cheio o  Pentágono. Mas acredita-se que muitos cortes virão do Departamento de  Estado também. Com redução em ajuda internacional e número de  diplomatas, a senhora acha que o chamado "smart power" dos EUA pode ser  afetado?
Essa é uma grande preocupação. Como cidadã americana e ex-secretária de  Estado, estou muito preocupada com o que está ocorrendo com o orçamento.
Uma democracia vibrante como os EUA tem responsabilidades globais. É  dever do nosso governo ajudar no progresso social de outros países e por  isso fico tão perturbada com corte no Departamento de Estado. Os EUA não podem fugir de seu papel global. E por isso estamos procurando parceiros, como o Brasil.
A senhora acha que haverá grandes mudanças na política de defesa dos EUA?
Os EUA estão passando por duas guerras. Mas o presidente Obama  está acelerando a retirada do Iraque e Afeganistão, com compromissos e  calendários. Então, obviamente, teremos um Pentágono muito diferente, em  um país que não está envolvido em duas guerras simultaneamente.
De qualquer maneira, o que mudou desde o 11 de Setembro é que há  uma cooperação muito maior entre as agências de inteligência e um  reconhecimento do fato de que o Departamento de Estado precisa  desempenhar um papel muito maior, baseando-se na experiência que tivemos  nos últimos anos.
Ficou claro que é essencial um grande número de diplomatas, civis,  nesses países em conflitos, para melhorar as condições políticas e  econômicas, e ter esse pessoal envolvido em reconstrução. Também é  importante ressaltar o papel crescente das aeronaves não-tripuladas  (drones), que foram muito eficientes nas missões para desmantelar a Al  Qaeda.
No novo cenário global, onde se encaixa o Brasil?
A visita do presidente [Barack] Obama ao país demonstra que, para os  EUA, o relacionamento com o Brasil é muito importante. Os Brics são um  agrupamento meio peculiar, mas, dentre os países Brics, o Brasil é único  porque é uma democracia forte, com a qual nós queremos trabalhar.
O presidente Obama está muito animado com a vinda da presidente Dilma  Rousseff aos EUA -ela será a primeira mulher a abrir a Assembleia Geral  da ONU. Eu estou muito animada com a minha ida ao Brasil, em outubro.  Fui várias vezes ao Brasil, quando era secretária de Estado, mas faz 11  anos que não vou ao país. Servi nas Nações Unidas ao lado do atual  ministro da Defesa, Celso Amorim.
Analistas decretam que missões de ajuda  humanitária e reconstrução, como as que os EUA fizeram na Somália, no  Haiti, em Kosovo e no Afeganistão, estão condenadas a desaparecer.
Há uma infinidade de jeitos de ajudar outros países a terem uma  infraestrutura e se tornarem sociedades funcionais. Mas nós não vamos  fazer isso sozinhos -também brasileiros vão se beneficiar muito se não  formos mais cercados por Estados falidos.
Nossos países, que sabem como liderar democracias funcionais, precisam trabalhar juntos para ajudar outros países.
Então vocês estariam dividindo com outros países a responsabilidade nas intervenções humanitárias?
Sim, lidero uma força-tarefa sobre "a responsabilidade de proteger" e o  que a comunidade internacional deve a cada país. Os EUA, como o Brasil,  estarão em uma situação muito melhor se houver estabilidade no mundo,  sem Estados falidos, então precisamos achar métodos de colaborar para  que não tenhamos Estados falidos.
A morte de Bin Laden decapitou a Al Qaeda, que não conseguiu reconstituir completamente sua liderança. Claramente ainda há células da Al Qaeda em vários lugares, então não podemos falar em derrota do terrorismo.
E, em relação a negligenciar outros aspectos, eu discordo -uma das características dos EUA é que nós conseguimos fazer várias coisas ao mesmo tempo. Temos observado a China, temos pontos muito positivos na relação, e outros que deixam alguns nervosos, como as intenções do país no mar do sul da China e em relação a Taiwan.
Fonte:
 / NOTIMP
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