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Amplos horizontes para pilotos que testam aviões






Mercado: Concorrido curso da FAB forma profissionais que chegam a receber R$ 30 mil mensais em empresas privadas. A engenheira Thaís Frachi Cruz é a primeira e única mulher a fazer parte do Grupo Especial de Ensaios em Voo (GEEV)

Virgínia Silveira
Claudio Capucho

Pouco conhecido do público em geral, mas bastante valorizado pelo mercado onde está inserido, o piloto de prova é o profissional que testa aviões que ainda não voaram - chamados de protótipos. O trabalho envolve risco, precisão e muita habilidade. Essas características, aliadas ao alto nível de formação a que são submetidos, permitem que eles controlem qualquer tipo de aeronave, pois foram treinados para testar todos os limites técnicos e operacionais de um avião.

"Pilotar uma aeronave nova e ensiná-la a alçar os ares é como uma criança que está aprendendo a andar", define o piloto militar de prova Eitel de Melo Sousa, formado na ETPS (Empire Test Pilot School), do Reino Unido, e um criadores do curso de Ensaios em Voo da Aeronáutica brasileira. Acima de tudo, segundo ele, é um trabalho que exige planejamento. "Em média, para cada hora de voo de ensaio gasta-se cerca de 10 horas com preparação e mais 20 horas para analisar os dados e confeccionar o relatório", explica o comandante do Grupo Especial de Ensaios em Voo (GEEV), do Departamento de Ciência e Tecnologia Aeroespacial (DCTA), em São José dos Campos, coronel Alan Elvis de Lima.

A experiência de voo e a capacidade para a tomada de decisões de emergência aportadas pelo curso do GEEV também ajudaram o militar Marcos César Pontes a se tornar o primeiro astronauta brasileiro. Pontes concluiu o curso de ensaios em voo em 1994 e alcançou o espaço em 2006, à bordo da nave russa Soyus TMA-8.

A excelência do curso da FAB trouxe ainda o reconhecimento internacional da conceituada Sociedade dos Pilotos de Prova de Aeronaves Experimentais (SETP), dos Estados Unidos. Além da escola brasileira, apenas seis no mundo - sendo três nos EUA, uma na Inglaterra, uma na França e outra na Índia, têm sua estrutura de ensino reconhecida pela SETP. Isso permite que os alunos do curso de ensaios em voo se tornem membros efetivos da entidade. A lista inclui nomes como o de Charles Lindbergh, primeiro homem que atravessou o Atlântico de avião, e o de Igor Sikorsky, pioneiro no desenvolvimento de helicópteros de grande porte, além de Howard Hughes, precursor dos satélites de comunicação e criador de um dos maiores aviões do mundo, o Spruce Goose.

Dois brasileiros figuram como membros honorários da SETP: Ozires Silva, um dos fundadores da Embraer, e o brigadeiro da reserva Hugo de Oliveira Piva, que coordenou o desenvolvimento de todos os foguetes de sondagem e armamentos guiados no Brasil no período de 1974 a 1987.

Desde 1986, quando foi iniciado, o curso de ensaios em voo do DCTA, em São José dos Campos, formou um total de 71 profissionais entre pilotos de prova de aviões e helicópteros. O curso também envolve a formação de engenheiros e de instrumentadores de ensaios, que somam mais 140 profissionais. A escola oferece ainda os cursos de recebimento de aeronaves prontas para entrar em operação, um processo posterior ao do ensaio em voo. Até o momento, segundo o comandante do GEEV, 131 pilotos de aviões e 68 de helicópteros, além de 31 engenheiros, tornaram-se especialistas no recebimento de aeronaves.

O total de pilotos de prova em atividade hoje nas Forças Armadas é de 38, sendo quatro da Marinha e no Exército e o restante da Aeronáutica. "A Aeronáutica conta ainda com mais 15 pilotos que já passaram pelo GEEV e ainda são oficiais da ativa com curso de ensaios em voo", explica o coronel Elvis. Quando atingem o tempo para aposentadoria na FAB, a maioria dos pilotos de prova vai trabalhar na iniciativa privada - em companhias de aviação comercial e executiva - e em empresas fabricantes de aeronaves como a Helibras e, principalmente, a Embraer.

Exame rigoroso exige avaliação de matemática e física

O processo de seleção de um piloto para o curso de ensaio em voo da FAB é um grande desafio a ser enfrentado por esses profissionais. São necessárias, no mínimo, 800 horas de voo, sendo que 200 horas em aeronaves a jato para os pilotos de asa fixa e 700 horas de voo em helicópteros para os pilotos de asas rotativas. Os candidatos ao curso de piloto de prova precisam ainda passar por um exame teórico de matemática e física.

O curso, segundo o comandante Alan Elvis de Lima, dura 45 semanas e a instrução terrestre contempla 650 tempos de aula. O treinamento aéreo prevê 120 horas de voo para pilotos e 100 horas de voo para engenheiros. No final do curso, os pilotos fazem um estágio de duas semanas em escolas parceiras do Brasil no exterior, onde têm a oportunidade de pilotar caças de outras forças aéreas, como o americano F-18, o europeu Eurofighter e o francês Mirage.

No caso dos engenheiros de ensaios em voo, o pré-requisito é a formação superior em engenharia - nas especialidades de aeronáutica, mecânica, eletrônica e computação eletrônica - envolvendo conhecimentos na área de software embarcado.

Primeira e única mulher na engenharia de ensaios em voo do Grupo Especial de Ensaios em Voo (GEEV), a engenheira Thaís Frachi Cruz é atualmente uma das profissionais mais experientes na parte de testes relacionados aos sistemas eletrônicos das aeronaves da FAB. O pioneirismo de Thaís começou no Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA), quando se tornou a primeira militar e engenheira eletrônica da instituição, em 2000.

"Estou muito satisfeita, pois o trabalho é desafiador e permite um aprendizado constante. Além disso, permite uma interação grande com vários setores da Força Aérea e a participação em missões em diferentes localidades", afirma Thaís, minutos antes de sair para participar de uma reunião no Rio de Janeiro sobre o programa de modernização da frota de aeronaves de patrulha marítima da FAB. A engenheira é uma das coordenadoras do projeto de modernização da frota de aeronaves Bandeirante da Aeronáutica.

Segundo Thaís, embora seja a única mulher engenheira de ensaios em voo, não existe diferença no convívio com os colegas de trabalho no que diz respeito ao tratamento e nas funções e obrigações a serem desempenhadas. "O que conta são a experiência e o conhecimento técnico", garante. Thaís atua no planejamento, execução e gerenciamento de ensaios em voo de modificação ou certificação de aeronaves e/ou sistemas embarcados. (VS)

Profissional ajuda a evitar erros na produção em série

A existência de um curso de piloto de prova com reconhecimento internacional no Brasil ajuda o país a economizar divisas. O preço de um curso de piloto de prova militar nos padrões da FAB é de US$ 1,2 milhão. "Isso sem incluir o salário e outros custos como transferência e passagens aéreas", explica o comandante do Grupo Especial de Ensaios em Voo (GEEV) do Departamento de Ciência e Tecnologia Aeroespacial (DCTA), em São José dos Campos, coronel Alan Elvis de Lima.

Segundo ele, existem cursos mais baratos e de curta duração (nove semanas), equivalentes ao Curso Preparatório para Recebimento de Aeronaves (CPRA), que o DCTA também oferece. "Esse tipo de curso é vendido no exterior a um custo que fica entre US$ 200 mil e US$ 300 mil", afirma o comandante Elvis.

Em empresas como a Embraer, por exemplo, o piloto de prova é visto como um profissional indispensável nos processos de desenvolvimento e certificação de suas aeronaves, pois são eles que testam e voam os aviões antes mesmos de serem produzidos em série. "Hoje, temos 29 pilotos de ensaios em voo: 11 de origem militar e 6 civis", explica o piloto chefe da área de Ensaios em Voo da Embraer, Mozart Marques Louzada Júnior.

Segundo Louzada, os outros 12 pilotos, que não fizeram o curso, trabalham na parte de voos de produção, além de compor a tripulação para voos de desenvolvimento. Piloto de prova formado pela FAB, Louzada está na Embraer há 10 anos, desde que se aposentou da carreira militar.

O trabalho do piloto de prova, segundo ele, exige uma habilidade de pilotagem incomum e extremamente precisa, bem como conhecimento técnico de engenharia - em especial nas áreas de desempenho, aerodinâmica, mecânica e controle de voo.

As situações de risco também não devem ser descartadas pelos profissionais da área. "Durante um voo, uma bomba que tinha um paraquedas abriu debaixo da asa de um caça F-5 que eu estava pilotando. Tive de pousar com a bomba e, felizmente, tudo acabou bem", conta Eitel de Melo Sousa, ex-piloto de prova da FAB e atual chefe de Operações da Metro Táxi Aéreo, uma empresa do grupo Alfa, localizada em São Paulo.

"Costumamos dizer que a experiência de voo não significa apenas muitas horas de voo. Na aviação comercial, o comandante pode ligar o piloto automático e ir tomar um cafezinho. O piloto de prova primeiro participa do desenvolvimento de todo o avião e testa seus limites. Só depois ele pode instalar o piloto automático. É muito mais desafiador", garante Sousa.

Os salários dos pilotos de prova também são atrativos e atualmente giram em torno de R$ 30 mil na iniciativa privada. Nas empresas, eles, geralmente, também assumem funções de comando em razão do conhecimento técnico e operacional adquiridos ao longo da carreira. "Os pilotos comerciais têm um conhecimento de tráfego aéreo muito bom, possivelmente até melhor que o do piloto militar. Em relação à parte técnica da aeronave e habilidades em situações de emergência, no entanto, o piloto de prova está mais preparado", ressalta o diretor da Metro Táxi Aéreo. (VS)

Fonte: VALOR ECONÔMICO, via NOTIMP




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