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Rigidez e discrição, o estilo de Dilma






Novo governo: Primeiros 30 dias da petista à frente do Planalto enfatizam o valor da fidelidade dos comandados, a divisão da máquina estatal para cobrar resultados dos ministros e a tentativa de qualificar a gestão pública.

Tiago Pariz.

A presidente Dilma Rousseff termina o primeiro mês no comando da República demonstrando preferência por atuar internamente, dividindo o governo em áreas e colocando quase como uma obsessão a melhoria da qualidade do gasto público. Ao mesmo tempo, se mostrou rígida na exigência de fidelidade dos comandados. Até por isso, nos primeiros dias ela tomou a decisão de demitir um ministro levando em conta exatamente este último quesito.

O alvo da fúria de Dilma na primeira segunda-feira do governo foi o general José Elito Siqueira, ministro do Gabinete de Segurança Institucional, que tinha dito, no dia de sua posse, que a existência de desaparecidos políticos durante a ditadura não deveria ser motivo de vergonha, mas tratada como um “fato histórico”. A presidente, que foi presa e torturada pelo regime militar (1964-1985), informou que os dias de Elito haviam acabado no governo. Uma comissão de militares, capitaneada pelo ministro da Defesa, Nelson Jobim, teve de ser formada às pressas para dissuadir Dilma. “Foi difícil convencê-la”, disse um personagem envolvido no episódio.

O recado que chegou a Elito foi o seguinte: “A mulher vai te demitir. É bom você ir lá pedir desculpas e se explicar para ver se ela aceita”. A contragosto, Dilma topou recebê-lo. O general entrou no gabinete do terceiro andar cabisbaixo e com a desculpa ensaiada. O ministro sobreviveu, mas o mesmo destino não teve Pedro Abramovay, ex-secretário Nacional Antidrogas do Ministério da Justiça. A demissão passou pela presidente e foi acertada com o titular da Justiça, José Eduardo Cardozo.

Contundência

Os dois casos irritaram a presidente, mas estão longe de terem ditado o ritmo do Planalto, que foi dado pela obsessão de melhorar a qualidade da gestão da máquina pública. Dilma dividiu o governo em quatro áreas: desenvolvimento econômico, infraestrutura, erradicação da miséria e direitos e cidadania. E quer resultados. Um exemplo é a contundência com que afirmou que obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) não serão cortadas. Repetiu a negativa três vezes em entrevista no Rio de Janeiro. “Não é nada surpreendente que a melhoria da gestão seja a principal meta dela. A trajetória da Dilma foi construída assim. É o perfil dela”, afirmou o presidente do PT, José Eduardo Dutra.

Para reduzir despesas desnecessárias, ela determinou aos ministros parcimônia com o cartão corporativo e com o uso de aeronaves da Força Aérea Brasileira (FAB). E pediu a Miriam Belchior que repassasse a ordem aos colegas: “Avaliem o orçamento e hierarquizem as ações”, num esforço para garantir que obras em andamento não sejam interrompidas. Dilma não quer ver frustradas suas promessas de campanha —por exemplo, 2 milhões de moradias, através do Minha Casa Minha Vida, e as 500 Unidades de Pronto Atendimento (Upas).

Clausura

O desastre climático na região serrana do Rio de Janeiro e a seca dos municípios da Região Sul fizeram a presidente mudar sua rotina enclausurada no Planalto e formar uma força tarefa para apresentar soluções. Novamente como parte da obsessão dela de mostrar que o governo é eficaz em suas ações.

Dilma prefere ficar distante dos holofotes, o que acabou refletindo em sua agenda. Em janeiro de 2003, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva teve mais encontros com governadores e parlamentares. Lula recebeu no Planalto titulares de vários estados. Dilma, por enquanto, teve duas reuniões com chefes do executivo local: Antonio Anastasia (Minas Gerais) e Marcelo Déda (Sergipe). Outro detalhe que chama a atenção é que quase todos os dias constam “despachos internos” na sua programação, que não trazem detalhes. Nos primeiros 30 dias da era Lula, os despachos internos eram exceção.

A presidente não gosta de ver assuntos do governo sendo tratados pela imprensa. Por isso, determinou aos subordinados: “Divergências são resolvidas internamente”, num recado sobre a briga pelo segundo escalão. O estilo serviu, primeiro, para apaziguar ânimos na disputa entre o deputado Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN) e o ministro da Saúde, Alexandre Padilha e, agora, para amenizar a briga pela Presidência de Furnas, que coloca em lados opostos o PT e o PMDB do Rio de Janeiro.

Colaborou Leandro Kleber, especial para o Correio

Decisões sem alarde

Obcecada pela melhoria da gestão pública, Dilma tomou decisões importantes nesse primeiro mês de governo

Desastre no Rio de Janeiro

O governo editou medida provisória liberando R$ 780 milhões. Do total, R$ 80 milhões serão enviados direto para o Dnit, órgão responsável pela recuperação das rodovias. Os recursos têm como objetivo ajudar os estados afligidos por enchentes. Além disso, repassou R$ 100 milhões ao governo fluminense e às prefeituras dos municípios atingidos.

Defesa Civil e alimentos

A presidente anunciou que serão investidos R$ 600 milhões para a estruturação da Defesa Civil nos municípios vulneráveis a desastres ambientais. Foram enviadas 44 toneladas de alimentos para Teresópolis, Petrópolis, Nova Friburgo e Areal. Além disso, os municípios receberam sete toneladas de medicamentos e insumos.

Seca e irrigação

A presidente anunciou que municípios afetados pela seca no Rio Grande do Sul terão obras de irrigação parecida com as já feitas pelo governo no sertão Nordeste.

Divisão estratégica

Para poder fazer cobranças mais efetivas por resultados, a presidente dividiu o governo em quatro áreas e atribuiu a um ministro a responsabilidade por cada uma delas. O ministro da Fazenda, Guido Mantega, responderá por desenvolvimento econômico. A titular do Planejamento, Miriam Belchior, ficou com infraestrutura. O ministro da Secretaria-Geral, Gilberto Carvalho, com direitos e cidadania. E Tereza Campelo, do Ministério de Desenvolvimento Social, com combate à pobreza.

Combate à pobreza

A primeira ação foi na principal promessa de campanha de Dilma. A presidente determinou que os ministros se esforcem para erradicar a pobreza extrema até o fim de sua gestão.

Salário mínimo

Dilma decidiu elevar para R$ 545 e determinou o início das negociações com as centrais sindicais. Apesar de haver uma proposta do governo de reajustar a tabela do Imposto de Renda em 4,5%, ela quer fazer essa discussão desvinculada do mínimo.

Demissão de subordinados

Logo nos primeiros dias, decidiu demitir o general José Elito, ministro do Gabinete de Segurança Institucional, mas voltou atrás por apelo de militares. Quem acabou perdendo o posto no governo foi Pedro Abramovay, da Secretaria Nacional Antidrogas, ligada ao Ministério da Justiça.

Porta-vozes e escudeiros

A presidente Dilma Rousseff impôs um ritmo discreto no Palácio e tem usado três ministros como porta-vozes: os titulares da Casa Civil, Antônio Palocci; do Planejamento, Miriam Belchior; e da Secretaria-Geral, Gilberto Carvalho. São os mensageiros de recados para Congresso, Judiciário, movimentos sociais, além de passarem de determinações aos colegas de governo.

O chefe da Casa Civil se consolidou como principal assessor. Está presente em praticamente todas as reuniões. É olhos e ouvidos de Dilma e atuou de maneira decisiva para contornar problemas com nomeações para o segundo escalão.

Palocci também quer refletir a discrição da presidente. Para não entrar na disputa de varejo, da política diária, o ministro da Casa Civil definiu que só dará entrevistas sobre grandes temas ou decisões. Ele quer evitar que sua palavra torne-se corriqueira e sem peso.

Carvalho assumiu o papel de escudeiro para canalizar insatisfações e vocalizar as orientações de Dilma com sindicalistas. Foi ele quem conduziu a negociação sobre o salário mínimo. O ministro da Secretaria-Geral chegou a brincar que a presidente teve de fazer uma aula com Lula para saber como lidar com os representantes dos trabalhadores.

A ministra do Planejamento encarnou a coordenadora de governo e passou a acompanhar Dilma e repassar ordens aos colegas. Ela esteve ao lado da presidente nas recentes viagens ao Rio de Janeiro. E passou ordens aos ministros sobre contingenciamento orçamentário.

Maleabilidade

Apesar da imagem de gerentona, quem se reuniu com Dilma nesse primeiro mês encontrou uma presidente afável e simpática, mais maleável. O presidente do PT afirmou não ser verdadeira a visão de mulher durona que se cristalizou durante a época em que ela ficou à frente da Casa Civil e na campanha. “Sempre contestei essa imagem. E não acho que houve mudança de comportamento”, afirmou, reconhecendo que na campanha eleitoral Dilma ganhou mais ginga. “É claro que depois da eleição, como tem que lidar com mais políticos, os interlocutores passam a descobrir esse lado mais afável dela”, emendou o presidente petista.

Ainda assim, as determinações enfáticas da presidente deixaram alguns ministros com medo de dar entrevistas e expor opiniões. Até agora só conversas informais com jornalistas. Os que partiram para declarações públicas envolveram-se em polêmicas, como no caso do salário mínimo, que colocou Guido Mantega, da Fazenda, na contramão de colegas. O presidente do PT classificou de naturais as palavras mais comedidas dos ministros. “O projeto é de continuidade. Não precisa de exposição e presença midiática”, disse Dutra.

Milhagem contida

O então presidente Lula também foi ao exterior mais vezes do que Dilma no início de seu mandato. A presidente chega amanhã à Argentina, em sua primeira missão oficial fora do país. Lula, nos primeiros 30 dias de mandato, foi ao Equador, à Alemanha e à França cumprir agenda externa.

Fonte: CORREIO BRAZILIENSE / NOTIMP



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