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Turbulências à vista









Dados coletados até outubro mostram que a expansão do número de passageiros nos aviões em 2010 será de 20%.

Márcio Pacelli.

Mais que uma dor do crescimento, a aviação nacional transformou-se na fratura exposta do violento avanço econômico do país. Numa conta rápida, especialistas explicam que o setor aéreo cresce, em média, o equivalente a duas vezes o Produto Interno Bruto (PIB) do período. Ou seja, se a expansão do país chegar mesmo aos 8% este ano, a aviação engordaria perto de 16%, um desempenho extraordinário, não fossem as condições precárias dos aeroportos e as dificuldades das companhias em contratar mão de obra treinada. O cenário é ainda mais nebuloso. Dados coletados até outubro mostram que o aumento do número de passageiros nos aviões em 2010 será de 20%.

A informação vem sendo monitorada pela Coppe, instituição de pesquisa da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) que, em janeiro deste ano, divulgou um diagnóstico preocupante do setor. Com foco na Copa do Mundo de 2014 no Brasil e nos desafios aeroportuários a serem vencidos até lá, o estudo chegou a prever a explosão da demanda de 2010. A realidade superou as estimativas.

O caso mais emblemático está em São Paulo. Maior aeroporto do estado — e do país —, Guarulhos deveria atingir 22,8 milhões de passageiros atendidos em 2010, segundo as previsões da Coppe. Considerados os números dos primeiros 10 meses do ano, mais as projeções de novembro e dezembro, o terminal fechará 2010 com 26,6 milhões de pessoas embarcadas. Os outros dois aeroportos paulistas também vão estourar as previsões. O de Congonhas não ficará com os 14 milhões de passageiros esperados, mas com 15,6 milhões. Campinas agregará mais 300 mil pessoas e atingirá 5,2 milhões de embarques e desembarques.

Sem passar por Brasília
“Tínhamos a expectativa de que houvesse uma redução da concentração em São Paulo, mas a situação se agravou. A demanda cresceu 23% no estado, ficando acima da média nacional”, diz Elton Fernandes, coordenador do estudo da Coppe, que terá sua nova edição divulgada entre janeiro e fevereiro de 2011. O Aeroporto Santos Dumont, no centro da cidade do Rio de Janeiro, contabilizará 7,6 milhões de passageiros este ano, contra 5,9 milhões aguardados. Entre os terminais importantes, apenas o Galeão (Rio) e o de Brasília não ultrapassaram as previsões. Eles fecharão o ano com 12,3 milhões e 14,1 milhões de passageiros, respectivamente.

O Galeão, que pelos cálculos da Coppe embarcaria 13,4 milhões de pessoas, perdeu demanda para o Santos Dumont. No caso de Brasília, que alcançaria 14,3 milhões de pessoas atendidas em 2010, o número ligeiramente menor é explicado por uma mudança de estratégia das companhias aéreas, que, para fugir da precária infraestrutura do aeroporto, adotaram voos diretos, sem passar por Brasília, relata Fernandes. Esse fato ajuda a entender, por exemplo, o aumento de 800 mil pessoas, além das 6,4 milhões já esperadas, no Aeroporto de Confins, em Belo Horizonte.

Se governo e empresas não conseguem conter o caos nos aeroportos a cada feriado ou fim de ano, o que esperar do futuro diante de uma demanda que só supera as previsões e torna ainda mais insignificante os investimentos na área? “O que tem ocorrido no Brasil são apenas reações. A cada problema, as autoridades anunciam novas medidas. Mas não se fazem prognósticos”, critica Fernandes.

Falta planejamento estratégico
Aos olhos do professor da Coppe, não é possível mais explicar a forte procura por bilhetes aéreos apenas pela elasticidade da renda dos mais pobres. A ascensão da classe C aos céus ocorre também por mudança de comportamento. “Está caindo um mito. Antes, os mais pobres não pegavam avião porque achavam que era coisa de rico. Agora, há, a cada dia, menos gente desinformada”, avalia. Nos grotões, ainda sobrevivem aberrações, como a do trecho que separa Belém, no Pará, de Manaus, no Amazonas. De barco, a viagem consome três dias a um custo de R$ 280. De avião, a tarifa promocional sai por
R$ 150 e o trajeto dura cerca de uma hora.

Mantido o barateamento dos bilhetes aéreos, não é difícil imaginar que a aviação derrotará as alternativas mais caras e lentas. Mas o diabo mora na burocracia e na leniência estatal (leia-se, Infraero). Sem a aceleração dos investimentos na aviação, a expansão do PIB pode ratear. As estatísticas mostram que a maioria expressiva dos bilhetes emitidos, algo entre 70% e 75%, são para viagens a trabalho ou a negócios. Para 2011, a Coppe projeta uma expansão natural de 10% a 11% no número de passageiros. Se não houver avião ou aeroporto para todos, executivos e profissionais liberais recorrerão a outros meios, como as videoconferências, para tocar a vida. Assim, a economia sairá perdendo.

Os números que mostram o salto da aviação comercial seriam alvissareiros, não fosse a falta de planejamento. Desde que a Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) parou de pensar o futuro da aviação — atividade herdada do antigo Departamento de Aviação Civil (DAC) —, o Brasil passou a avançar ao sabor das necessidades do mercado. “Nada é programado. Tudo é feito a reboque de crises”, define Fernandes. Dias atrás, o mercado da aviação chegou a se animar com o anúncio da criação da Secretaria Especial de Aviação Civil, a se subordinar diretamente à Casa Civil. O órgão pode retomar a programação estratégica do setor. Mas, se for mais um inoperante, e virar apenas um cabide de empregos, o país pode contar com fortes turbulências no horizonte.

Fonte: CORREIO BRAZILIENSE / NOTIMP

Foto: Andomenda




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